Vivemos em uma era de geração de dados e informações crescente e constante. E o ritmo não para de aumentar. Estimativa do IDC (Internacional Data Corporation), empresa líder em inteligência de mercado e consultoria nas indústrias de tecnologia da informação, telecomunicações e mercados de consumo em massa e tecnologia, mostra que, em 2025, deveríamos chegar a 175 zetabytes de dados gerados em um único ano. Um zetabyte significa um trilhão de gigabytes.
Mas a estimativa foi superada pela velocidade da sociedade digital. De acordo com Ricardo Cappra, cientista chefe, fundador e CEO do Cappra Institute, já em 2021 o mundo vai se deparar com esta imensidão de dados – e grande parte deles não serão aproveitados. “Isto significa um grande problema para nós, como tomadores de decisão e sociedade. Só vamos conseguir analisar 3% de toda esta informação disponível”, destaca Cappra.
Lidar com a geração de dados é a especialidade do Cappra Institute. Fundado há 22 anos, o laboratório global especializado em Ciência de Dados tem como missão democratizar a cultura analítica. Com um portfólio de clientes variado e de alto nível, como Google, governo norte-americano, Banco Mundial, Unilever e Ambev, o instituto ajuda empresas e organizações a serem mais analíticas através do desenvolvimento de laboratórios próprios de dados. Há cerca de 3 anos, transferiu para os Estados Unidos a área de P&D, com laboratórios em Miami, São Francisco e Boston.
Pesquisador de cultura analítica, Cappra diz que novos modelos de negócios pedem o livre fluxo das informações nas organizações. “São as ‘infoorganizations’, que não são mais baseadas em processos, mas em informação. A organização se redesenha de acordo com a chegada dos dados. Se precisar mudar o negócio porque mudou o jeito que as pessoas consomem, isso vai aparecer nos dados e o negócio vai ser redesenhado a partir disso”.
Durante encontro digital promovido pelo Experience Club, Ricardo Cappra destacou 7 passos que as empresas e organizações devem seguir em busca de um framework de inovação e de uma cultura mais analítica. “Nossa próxima onda é uma transformação analítica, porque a única coisa que está ficando de estoque, fora o comportamento humano, são dados. Inevitavelmente, o nosso próximo processo, a nossa próxima evolução vai vir destes dados disponíveis, que estão na nossa mão”.
1- Os 4 pilares da cultura analítica
“A cultura analítica é composta por 4 pilares: Pessoas, Processos, Tecnologia e Políticas. As Pessoas são aquelas que precisam se transformar e se desenvolver mais analiticamente para poder olhar para os dados de uma outra forma. Tanto as que trabalham com dados, como as que tomam decisões a partir deles. Os Processos estão se modificando por causa de dados dentro de todas as organizações. A Tecnologia é o que sustenta tudo isso. E o pilar das Políticas, que tem muito a ver com governança, são os líderes de negócios que fazem com que esta transformação aconteça”.
2- Feeling não é escalável
O time de dados (analistas, cientistas, programadores e técnicos) e o time de negócios não conseguem conversar, a linguagem é diferente. E as áreas de negócios demoraram muito para usar dados na tomada de decisão. “Somos orientados por feeling. O problema é que feeling não é escalável. Não dá para dar escala para o feeling na hora em que tenho que passar uma atividade, uma tarefa ou alguém vai tomar as decisões. As pessoas não estão preparadas para estes processos decisórios porque não estão amparadas por um processo de dados analíticos. Estão amparadas pela pessoa que tomava a decisão e ajudava no dia a dia. Agora, no trabalho à distância, como repassar o feeling para aquela pessoa da outra ponta, que está na casa dele, em outro lugar do mundo?”
3- Dados como valor
“Se olharmos as companhias top 5 do mundo, todas elas são empresas em que o principal tangível é a quantidade e qualidade de dados que eles têm. Amazon, Google, Facebook, o valor destas empresas está nos dados que elas que possuem. Até agora estamos falando em um processo de transformação digital. Por isso que nossa próxima onda é uma transformação analítica. A nossa próxima evolução vai vir destes dados disponíveis. Não aconteceu na velocidade que deveria acontecer, mas a revolução analítica vem acontecendo aos pouquinhos para poucas grandes empresas que estão usando isso”.
4- Maturidade analítica das organizações
Estudos mostram a evolução da maturidade data driven. Começa com a negação de que os dados podem ajudar. Depois há um momento de descoberta e de curiosidade. Até chegar ao nível de testes, que incrementam e geram valor à base de dados. “Começamos a dar passos, a nos sentirmos seguros olhando para os dados para tomar decisão, até que se avance para uma maior maturidade analítica data driven. É um fluxo. O instituto faz o mapa do índice de maturidade analítica das organizações e vimos que o Brasil estava saindo da fase de negação e está na fase de curiosidade. Mas ainda testando pouco. Na verdade, é preciso desenvolver uma mentalidade analítica, que mistura mentalidade crítica com um pensamento tecnológico”.
5- Cultura do experimento
“As organizações estão sentindo necessidade de experimentar coisas novas e isto está trazendo espaço para plugar outros tipos de empresas e negócios. O problema maior não está na empresa grande, tradicional, precisar do experimento e, sim, quando ela pluga esta outra empresa, esta startup, e ela não consegue conviver no dia a dia com ela, porque é muito diferente. Tem uma barreira ali. É claro que toda esta transformação vai quebrar um pouco a distância, mas este diálogo precisa ser mais fluido. Com tantos métodos ágeis disponíveis, eles deveriam estar estruturados para fazer esta fusão entre estes dois grupos, porque basicamente é uma linha de diálogo que não é disponível e a comunicação não funciona. Claro que tem exceções. Empresas que estão se dando muito bem. Empresas grandes trabalhando melhor que startups. O que vemos é o ruído no diálogo, entre a linguagem da startup, do digital, e a linguagem do tradicional, processual, hierárquico”.
6- Fluxo de informação solto
“A informação foi estruturada dentro de banco de dados, assim como as organizações. Tem um departamento de Vendas que tem um banco de dados de Vendas; tem departamento de Marketing que tem meu banco de dado de Marketing. É tudo o mesmo banco de dados, mas as análises são separadas por estes centros. Quando tem que fazer o cross de Marketing com Vendas, pegando duas áreas que são coladas, mas que têm seus próprios processos e fluxos separados, as análises saem separadas. Depois os líderes tentam fazer o cross de dois reports que chegaram diferentes, das duas áreas. O primeiro passo é desmontar o jeito processual de pensar, hierárquico e até militar que estruturamos as empresas e entender que a informação não tem este fluxo. Ela é solta. Devíamos preparar um framework, ou um jeito para que esta inovação não tivesse a camada separada estrutural que temos hoje. Não deveria mais ter este silo de informação. A informação deveria ser livre, ela é fonte de poder. No momento em que bota barreira, limita o poder”.
7- Troca personalizada
“É um momento de educação. É importante a conscientização da sociedade para entender os benefícios do uso dos dados. Quando falamos nas leis de privacidade de dados, este benefício de ser identificado, de ter melhor produto oferecido, da personalização de oferta, é uma troca. Claro que se a troca não tiver valor – estou dando meus dados e recebendo propaganda, só mídia – não quero. Sou totalmente a favor das leis que estão sendo criadas, mas também acho que deveria existir uma lei de doador universal de dados. Porque quem sabe o que as empresas estão fazendo com os dados, poderia bloquear as que não querem que usem seus dados. As leis estão vindo e precisam ser adaptadas. Temos tempo para isso, para evolução da sociedade, mas acho que estamos indo num caminho de que logo estes serviços personalizados vão começar a acertar mais do que errar”.
Texto: Andrea Martins
Imagens: Reprodução