Autor: Johann Hari
Ideias centrais:
1 – A crise de atenção pela qual passa a sociedade moderna é consequência, entre outros fatores, do desenvolvimento de artefatos de distração: smartphones, aplicativos, redes sociais.
2 – Essa crise exige grande esforço para ser superada. E ainda que haja certa percepção de que a perda de foco é um problema individual, trata-se de uma ideia errônea – ela exige respostas coletivas.
3 – O mundo corporativo cria estratégias para culpabilizar indivíduos por danos cometidos coletivamente, como, por exemplo, o déficit de atenção dos filhos.
4 – Empatia é uma das formas mais complexas e preciosas de atenção existentes. Empatia torna o progresso possível.
5 – Estado de vigilância permanente induzido por situações de violência, trauma na infância etc. levam a crises de atenção.
6 – Divagar é essencial para encontrar soluções criativas e gerar aumentos de produtividade.
7 – Interrupções no dia a dia normal de trabalho têm relação com uma miríade de tarefas que o trabalhador médio é obrigado a desempenhar; CEOs das 500 maiores companhias do mundo da lista da revista Fortune têm apenas 28 minutos diários de sua jornada diária imunes a interrupções.
8 – O transtorno de atenção de crianças tem razões multifatoriais e relaciona-se com seu entorno; estresse, condições socioeconômicas e até mesmo poluição do ar são gatilhos para a doença.
Sobre o autor:
Johann Hari é jornalista e escritor escocês com best-sellers nos Estados Unidos como Na Fissura: uma história do fracasso no combate às drogas (editado no Brasil pela Companhia das Letras) e Lost connections: uncovering the real causes of depression (Conexões perdidas: revelando as causas reais da depressão; não traduzido para o português). É também best-seller no Ted Talks: as palestras “Everything you think you know about addiction is wrong” (“Tudo aquilo que você achava que sabia sobre vício está errado”) e “This could be why you are depressed and anxious” (“Esta pode ser a razão pela qual você está depressivo e ansioso”) foram vistas mais de 75 milhões de vezes.
INTRODUÇÃO
Como é comum em livros de autores de não-ficção, especialmente para aqueles que são jornalistas, uma jornada de conhecimento é relatada pela fusão de dois planos: o da reportagem e o da narrativa pessoal. Nosso “herói” abre seu livro sobre transtorno de atenção e perda de foco contando sobre uma viagem a Graceland com o neto, fã de Elvis Presley. Mesmo na “Xanadu” dos seguidores de Elvis, ele é incapaz de tirar seus olhos da tela do celular; em seguida, o próprio autor embarca num detox digital.
A própria experiência de déficit de atenção vivida antes irá embasar seu livro, em que discute com especialistas indicadores como o que coloca um aluno do ensino médio americano a manter foco em algum assunto por apenas 90 segundos. Trabalhadores adultos não se saem muito melhor: a atenção em determinada tarefa dura, em média, três minutos. Outro estudo indica que as pessoas demandam 23 minutos, em média, para retomar o estado de foco perdido após eventos de interrupção.
Capítulo 1 – Cause one: The increase in speed, switching, and filtering
Antes de empreender seu detox digital, o autor descreve seu rito de preparação numa paleta algo cômica: ele tenta comprar um celular sem qualquer função exceto a de atuar como telefone. Cita Ulisses, o herói da Odisseia, de Homero, atado ao mastro de seu barco e com os ouvidos tapados, para não se deixar seduzir pelo canto das sereias, como modelo do que chama de “pré-compromisso” consigo próprio. Com pré-compromissos seria mais fácil cumprir os objetivos, como enveredar por uma dieta (ou por seu detox digital).
Com algumas semanas desse seu exílio, o autor encontra-se com Sune Lehmann, da Universidade de Copenhague, que havia empreendido uma grande pesquisa na Europa sobre o declínio de atenção. A partir de indicadores como trend topics do Twitter, o acadêmico inferiu que sistemas que partilham cada vez mais informação retêm seus leitores por menos tempo em cada assunto. Mais velocidade de leitura significa menos entendimento. Há um limite de absorção de informação e ultrapassá-lo custa ao cérebro habilidade de entendimento. Assim, a ideia de realizar diversas tarefas ao mesmo tempo é uma quimera. A ciência mostra que quando as pessoas acham que estão em performance “multitarefa” estão, na verdade, a trocar de tarefas.
Capítulo 2: Cause two: The crippling of our flow state
As redes sociais aprenderam a “alimentar” usuários com likes e emojis, criando dependência; curiosamente, a ideia de que a maior parte das pessoas busca o “like”, a recompensa a qualquer custo, não faz sentido para algumas delas – o autor lista artistas, poetas, enxadristas, montanhistas ou, genericamente, “pessoas criativas”. Elas sentem prazer ao viver experiências em que encontram o chamado “estado de flow”, em que a concentração é fluida e intensa e o tempo parece desaparecer. Trata-se, diz Hari, da mais profunda forma de foco conhecida.
Episódios vividos em estado de flow são citados por quem os vivenciou como alguns dos eventos mais importantes de suas vidas. É preciso fazer algo que faça sentido para alcançar o estado de flow. A tarefa deve ser desafiadora, mas não além das possibilidades de quem a realiza.
O autor faz uma sistematização entre duas forças – a fragmentação da atenção, que torna as pessoas mais incomodadas, furiosas; e o estado de flow, que engrandece, acalma.
Capítulo 3 – Cause three: The rise of physical and mental exhaustion
Há uma perda progressiva de sono na sociedade moderna que leva a distúrbios de atenção. Alguns dados que corroboram isso são o fato de que 40% dos norte-americanos não dormem as sete horas mínimas recomendáveis. No Reino Unido, 15% dos britânicos reportam acordar cansados; desde 1942, calcula-se que o tempo de sono médio dos habitantes tenha caído em uma hora.
Menos sono, mais perda de foco imediato e de capacidade de raciocínio mais profundo. O autor insere pela primeira vez no livro um de seus temas de eleição, o Transtorno de Déficit de Atenção com Hiperatividade (TDAH), doença crônica disseminada especialmente entre crianças. Sandra Kooji, apresentada como uma das grandes experts do TDAH em adultos da Europa, diz que a “sociedade ocidental sofre de TDAH porque somos privados do sono”. “É bestial (…) Estamos sempre com pressa, somos todos impulsivos, irritados com o trânsito. Você vê isso em qualquer lugar”, diz ela.
A professora de neurociências da Universidade de Minneapolis, Roxanne Prichard, é lapidar: “Quando estamos dormindo, estamos fazendo reparações [no corpo e na mente]”. Há ainda ilações sobre o desenvolvimento econômico das sociedades e sua relação com a privação estimulada do sono.
Capítulo 4 – Cause four: The collapse of sustained reading
A proporção de americanos que lêem livros para desfrute pessoal está no nível mais baixo já registrado. Em 2017, cada americano gastava diariamente 17 minutos com um livro – e 5,4 horas em seus smartphones. Trata-se de um problema: ler é uma das maneiras mais efetivas de focar. Uma pesquisadora da Universidade de Stavanger, na Noruega, criou dois grupos de estudos e ofereceu a ambos o mesmo conteúdo, mas em formatos distintos: livros para os primeiros, meios digitais para os últimos; houve menos entendimento e fixação por parte de quem utilizou os meios digitais. A “inferioridade das telas”, como Johann Hari chama esse gap, pode representar, para crianças de ensino fundamental, dois trimestres inteiros de tempo de compreensão.
É recomendável ler ficção: Raymond Mar, professor de psicologia da Universidade de Toronto, vê ganhos de empatia quando a atenção flutua entre as palavras e aquilo que elas representam. A empatia, considera o autor, é uma das mais complexas formas de atenção existentes, pois implica perceber e entender o entorno e seus atores.
Capítulo 5 – Cause five: The disruption of mind-wandering
A divagação é essencial para urdir sentido ao que é percebido e entendido. Jonathan Smallwood, professor de psicologia da Universidade de York (Reino Unido), explica que, durante a leitura, ação de concentração por excelência, há sempre espaço para a divagação. Esse espaço é necessário também para organizar os objetivos pessoais, ser criativo e tomar decisões de longo alcance. Para ser produtivo, não é indicado estreitar ainda mais o foco, pois há uma capacidade finita de atenção.
Outro especialista entrevistado por Hari, Nathan Spreng, professor de neurologia da Universidade McGill, de Montreal, no Canadá, diz que controle total sobre os pensamentos não é bom caminho para a produtividade; afirma ainda que sua receita para fixar conhecimentos é caminhar uma hora por dia, divagando.
O autor chega à conclusão de que, em nossa cultura, a maior parte do tempo em que as pessoas não estão focando em algo, tampouco usam para divagar. “Estamos sempre ciscando.”
Capítulos 6 e 7 – Causes six and seven: The rise of technology that can track and manipulate you (partes 1 e 2)
James Williams, ex-estrategista do Google, comenta sobre a digital detox do autor e vê algo de quixotesco na ideia, já que esta não configura uma solução efetiva. É como, diz ele, tentar endereçar a questão da poluição atmosférica usando por alguns dias uma máscara de gás. “São as mudanças ambientais que fazem a diferença”.
Entra em cena então outro ex-funcionário do Google, Tristan Harris, relativamente famoso por aparecer no documentário Social Dilemma, sobre a destrutividade das mídias sociais. Quando no Google, Tristan temia que milhões de usuários fossem constantemente instados a engajar-se, ou seja, a manterem-se cada vez mais tempo online – afinal, o negócio da companhia é disputar a atenção de sua audiência. “Não é por sua culpa que você não consegue [manter] foco. Isso é desenhado. Sua distração é o combustível deles [das redes sociais]”, diz Tristan.
Outras figuras do Vale do Silício, como Aza Raskin, responsável por ter criado o código de programação do scroll infinito – a rolagem constante de tela, também aparecem no livro. Com o recurso criado por Aza, usuários passaram a ficar 50% mais tempo em redes como o Twitter.
Uma ironia: em empresas como Google e Facebook, workshops de mindfulness, prática aparentada da meditação usada para aprimoramento de foco, tornam-se “incrivelmente populares”; e Google e Facebook são, sublinha Hari, os maiores perpetradores do mundo de algo que é o “perfeito oposto do mindfulness”.
Capítulo 8 – Cause seven: The rise of cruel optimism
O autor infere que truques para driblar distrações, como esperar mais de 10 minutos para checar novamente os e-mails, mostram-se pouco promissores para a solução do problema coletivo da perda de atenção. Ronald Purser, professor de administração na San Francisco State University, apresenta o conceito de “otimismo cruel”, quando é oferecida uma solução individual e simplória para um problema estrutural complexo e coletivo – obesidade ou depressão, por exemplo.
A solução é “tão cega das causas mais profundas” do problema, reflete o autor, que a maior parte das pessoas afetadas acaba por fracassar. Assim, não surpreende que 95% dos que perdem determinado peso em dieta recuperem-no dentro de cinco anos. Não é definitivamente questão de “não ser bom o suficiente”, mas de entender, no caso da perda de atenção, que “você pode até tentar o autocontrole, mas há milhares de engenheiros do outro lado da tela trabalhando contra você”.
Capítulo 9 – The first glimpses of the deeper solution
É possível (e desejável) na visão de três interlocutores de Hari, Tristan Harris, Aza Raskin e Shoshana Zuboff, fazer com que governos criem limites para o que chamam de “capitalismo de vigilância”, sistema em que o modelo de negócio das empresas é rastrear online os passos de seus clientes para oferecer-lhe produtos customizados. Trata-se, para Aza, de um modelo “anti-humano e antidemocrático”.
Criar códigos de programação para sustar notificações ou interromper o scroll infinito, assim como incluir uma ferramenta que indique que há amigos (reais) em localizações próximas, seriam providências simples e efetivas. Resta ainda a atuação política (coletiva) para endereçar os problemas, e Hari lança mão da história do movimento feminista para lembrar que “forças aparentemente imóveis podem ser movidas por pessoas comuns”.
No que concerne à força do capitalismo de vigilância, o autor deixa uma mensagem de otimismo: “O poder concentrado dos homens em 1962 [ao tempo da eclosão do movimento feminista] era bem maior do que o poder das big techs em 2021”.
Capítulo 10 – Cause eight: the surge in stress and how it is triggering vigilance
No começo de 2020, a primeira pesquisa científica sobre atenção foi levada a cabo pelo instituto YouGov nos Estados Unidos e no Reino Unido. Os entrevistados confirmaram uma piora na atenção, motivado por fatores diversos como estresse (48%); mudança de hábitos de vida (48%); dificuldades para dormir (43%); e uso de celular (37%) – respostas múltiplas eram permitidas. A pesquisa serve de “música incidental” para a hipótese do capítulo, a responsabilidade do entorno na perda de foco.
A partir de casos tratados pela psicoterapeuta Nadine Harris, fica-se sabendo das dificuldades de atenção de quem – adulto ou criança – desenvolve hipervigilância em relação ao seu entorno, como, por exemplo, uma criança em presença de um parente violento. E de como esse estado leva à perda de foco. Crianças que sofreram traumas por abuso ou ameaças psicológicas, por exemplo, são 32,6 vezes mais propensas a ser diagnosticadas com distúrbios de atenção em comparação com aquelas que não passaram por isso.
Para ter atenção plena, conclui Hari, é preciso sentir-se seguro. Num ambiente de risco, a mente desenvolve estratégias para detectar sinais iminentes de perigo – em detrimento de outros possíveis objetos de atenção.O estresse pode causar mudanças na estrutura cerebral com efeitos de longo prazo. Testes de QI com pessoas em situações de estresse financeiro corroboram a ideia.
Capítulo 11 – The places that figured out how to reverse the surge in speed and exhaustion
Uma experiência de uma semana de quatro dias de trabalho em uma empresa da Nova Zelândia mostra que o nível de estresse dos colaboradores é menor e seu engajamento maior. Em outro exemplo, no Japão, a Microsoft migra para a semana laboral de quatro dias e reporta produtividade aumentada em 40%. No entanto, a semana laboral mais curta, ainda que prove-se desejável do ponto de vista empresarial, é cenário distante. Nos Estados Unidos, 56% dos trabalhadores só conseguem tirar até uma semana de férias anuais.
Hari ainda lembra do advento da economia do compartilhamento, que levou trabalhadores a ter rotinas intermitentes, sem proteção sindical. A pandemia de covid-19, ainda que tenha mostrado a viabilidade do trabalho remoto, trouxe a inevitabilidade, pode-se dizer, da jornada estendida, com o colaborador disponível por muitas horas diárias.
Capítulo 12 – Causes nine and ten: our deteriorating diets and rising pollution
A alimentação baseada em produtos frescos dá lugar a alimentos processados. Estes contêm conservadores e estabilizadores para manter bom aspecto ao chegar à mesa do consumidor. Açúcares e gorduras também são acrescentados a esses alimentos, distanciando-os ainda mais daqueles colhidos na natureza. Uma pesquisa sobre déficit de atenção feita na Holanda, em 2009, separou dois grupos de crianças e dividiu-as segundo a dieta que faziam: uma de “eliminação”, mais próxima da dieta de nossos antepassados; a outra alinhada com o que se faz usualmente no século 21. A melhora média na atenção que coube ao primeiro grupo foi da ordem de 50%.
Estudo feito com crianças em Southampton, na Inglaterra, havia mostrado que alguns corantes poderiam induzir a distúrbios de atenção – esses produtos foram banidos de países europeus, mas mantêm-se presentes em cereais e snacks nos Estados Unidos. O autor considera a hipótese desse corante ser um dos grandes vilões pela diferença nos números de TDAH nas duas regiões. Joel Nigg, especialista em TDAH visitado por Hari em Portland, é lapidar: “Se você considera que o TDAH de seu filho tem alguma relação com a comida, a ciência agora concorda com você”.
Hari passa a investigar os problemas atmosféricos e cita os males do chumbo adicionado à gasolina, composto que sobreviveu durante seis décadas nos postos dos Estados Unidos, mesmo com as evidências científicas que indicavam, entre outros males, propensão duas vezes e meia maior para diagnósticos de TDAH.
É levada a cabo então uma breve digressão sobre as estratégias da indústria para desqualificar as pesquisas científicas e o autor torna a reiterar as dificuldades de viver numa sociedade na qual os problemas estruturais são escamoteados. Agora ainda há os pesticidas, novas substâncias químicas que são aprovadas sem o mesmo rigor dos testes de fármacos. “Não é possível ter um cérebro normal hoje em dia”, diz a bióloga e endocrinologista francesa Barbara Demeneix.
Capítulo 13 – Cause eleven: the rise of ADHD and how we are responding to it
O capítulo é dedicado a contrapor a visão ainda alastrada de que déficit de atenção em crianças e adolescentes tem razões genéticas. Alguns dados: os casos de TDAH nos Estados Unidos cresceram 43% entre 2003 e 2011; no Reino Unido, entre 1998 e 2004, o número de adolescentes recebendo medicação de estimulantes dobrou. O mercado desses remédios já vale US$ 10 bi.
Crianças submetidas a situações de estresse, como visto em outro capítulo, têm mais probabilidade de serem diagnosticadas com déficit de atenção. Remédios outrora comumente prescritos, como Ritalina e Adderall, podem gerar efeitos colaterais perniciosos, e por isso sua recomendação vem sendo reduzida. Há impactos no crescimento, na menstruação e, possivelmente, no funcionamento do coração. James Li, da Universidade de Wisconsin, diz: “Não conhecemos os efeitos [dessas medicações] no longo prazo”. Testes feitos com ratos por três semanas – período equivalente a sete anos em humanos – indicam encolhimento de um grupo de neurônios.
Capítulo 14 – Cause twelve: the confinement of our children, both physically and psychologically
Nos Estados Unidos, em 2003, apenas 10% das crianças brincavam em ambientes abertos com alguma frequência. Antes, crianças brincando sem supervisão de adultos nesses ambientes era cena comum. Nos tempos atuais, até a ideia disso parece extravagante. Joel Nigg, especialista de TDAH de Portland, diz a Hari que exercícios aeróbicos expandem as conexões cerebrais. Outros cientistas coonestam a ideia de que brincadeiras desenvolvem habilidades cruciais que serão exigidas na vida adulta como a negociação, a observação do interlocutor e a lida com a frustração.
Especialista no aprendizado lúdico, a chilena Isabel Behncke diz a Hari que há evidências de que três áreas do desenvolvimento são impactadas pelos jogos e brincadeiras: criatividade e imaginação; laços sociais; e o aprendizado de como potencializar a alegria e a satisfação. Com a muito mais comum supervisão e intervenção de adultos nas brincadeiras das crianças – e com regras determinadas por aqueles –, essas habilidades podem não ser desenvolvidas pelos pequenos.
Exige-se cada vez mais tarefas escolares. De 1984 a 2002, nos Estados Unidos, 7,5 horas semanais de tarefas foram adicionas à vida das crianças.
O desenvolvimento do foco também passa por querer realizar alguma tarefa, ou seja, por realizar um ato voluntário – motivos “intrínsecos”, na expressão do autor; mas numa sociedade em que adultos ditam a rotina de seus filhos, especialistas creem ser difícil para as crianças encontrarem razões intrínsecas em suas ações rotineiras. Não há tempo para isso.
Uma escola em Long Island (Nova York) engajou-se numa campanha chamada Global Play Day (Dia mundial da brincadeira, em tradução livre), em que as crianças eram livres para determinar o que fariam no dia. A maior parte delas ficou inerte por longo período.
Ao final da seção, Hari visita a Sudbury Valley, escola em que os alunos são corresponsáveis pelas decisões pedagógicas, e que ali fazem as tais coisas intrínsecas: jogar, criar peças de artesanato, desenvolver artefatos tecnológicos, cozinhar. Os resultados são animadores: segundo o especialista do Boston College que acompanhou a evolução de grupos de alunos da Sudbury, quando adultos eles encontraram empregos e meios de vida alinhados com os propósitos pessoais.
CONCLUSÃO
James Williams, ex-estrategista do Google, divide as formas de atenção em três camadas – e todas elas vêm sendo “roubadas”: spotlight, para decisões imediatas; starlight, para projetos de médio e longo prazo; e daylight, que permite discernir e justificar as decisões a tomar. Perder essa terceira camada é a pior forma de distração, já que dessa forma não há mais propósito nas ações cotidianas.
Hari medita sobre uma quarta camada, que ele próprio batiza de stadium lights, que faculta prestar atenção no interlocutor e estabelecer atividades de cooperação.
O autor encerra seu livro fazendo-o coincidir com sua própria jornada. São as lições de sua longa reportagem que ele pretende aplicar agora para si mesmo. Hari irá:
- a) usar acordos prévios (pre-commitments);
- b) buscar o estado de flow, tentando descobrir e realizar as coisas que lhe fazem sentido;
- c) passar seis meses descontínuos do ano distante das redes sociais;
- d) permitir-se divagar (mind-wandering);
- e) dormir oito horas por noite, mudando a concepção prévia de que sono seria um “luxo”;
- f) brincar livremente com as crianças de sua família.
Ao final, o autor se vê enredado, como todo o planeta, no “novo normal” da covid, e nota que a pandemia ajudou a hipertrofiar ainda mais os processos que vinham corroendo a capacidade de prestar atenção. Paradoxalmente, há crescimento de 300% para a busca no Google para a frase “como fazer o cérebro focar?”.
Por fim, Hari se encontra com o head de comunicação do Greenpeace, que o orienta para criar um movimento – ou uma rebelião, a “rebelião da atenção”. A justificativa é que jamais houve na história da humanidade momento mais crítico para isso, dado que vivemos a iminência do apocalipse climático.
FICHA TÉCNICA:
Título original: Stolen focus: Why you can’t pay attention
Autor: Johann Hari
Resenha: Paulo Vieira
Edição: Monica Miglio Pedrosa