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Outliers: the story of success

Autor: Malcolm Gladwell

Ideias centrais:

1 – A cultura a que pertencemos e os legados transmitidos por nossos ancestrais moldam os padrões de nossas realizações. Os valores do mundo que habitamos e as pessoas que nos cercam exercem um grande efeito em quem nós somos.

2 – A ideia de que a excelência em uma tarefa complexa requer um nível de prática mínima sempre ressurge. Na realidade, pesquisadores chegaram ao que acreditam ser o número mágico para a verdadeira excelência: 10 mil horas de treinamento, que equivalem a cerca de três horas por dia, ou 20 horas por semana, durante 10 anos.

3 – Inteligência prática é o conhecimento que ajuda a interpretar as situações de modo correto e obter o que se deseja. É um tipo de inteligência diferente da capacidade analítica medida pelo QI. Uma pessoa pode ter muita inteligência analítica e pouca inteligência prática e vice-versa.

4 – As causas da superioridade dos asiáticos em matemática parecem óbvias. As férias dos alunos das escolas asiáticas não são tão longas e eles se dedicam mais aos estudos. Nos EUA, o ano escolar dura, em média, 180 dias; na Coreia do Sul, 220 dias; no Japão, 243 dias.

5 – Um aluno não precisa de um laptop, de uma turma menor nem de um apartamento maior. Todas estas coisas seriam ótimas de se ter, mas não atingem o ponto central da questão: uma chance, como aprendizagem eficaz, poderia ser o diferencial para o sucesso na vida.

Sobre o autor:

Malcolm Gladwell nasceu na Inglaterra. É jornalista e autor, fez sua carreira nos Estados Unidos. Além do presente livro, publicou O ponto de virada, Davi e Golias, Blink e Falando com estranhos.

Introdução:

Imigrantes italianos de Roseto, Itália, migraram para os EUA, fundando um pequeno núcleo com o mesmo nome do lugar de origem, Roseto, localizado no estado da Pensilvânia. Roseto ficou famosa pela longevidade de seus habitantes. Seria talvez pela dieta alimentar observada desde a antiga pátria? O médico Stewart Wolf e o sociólogo John Bruhn foram a campo para pesquisar o fenômeno.

Quando Bruhn e Wolf apresentaram suas descobertas à comunidade médica, enfrentaram uma grande reação de ceticismo. Eles participaram de conferências em que seus colegas estavam exibindo longas relações de dados, dispostos em gráficos complexos, para se referir a um tipo específico de gene ou de processo biológico. Eles, porém, estavam falando dos benefícios misteriosos e mágicos de parar para conversar com as pessoas na rua e dos efeitos positivos de familiares de três gerações viverem sob o mesmo teto.

Segundo o pensamento convencional da época, uma vida tranquila dependia, em grande parte, de quem éramos, ou seja, de nossos genes. E também das decisões que tomávamos em relação à escolha dos alimentos, da nossa opção quanto à prática de exercícios físicos e, ainda, da eficácia do sistema médico. Ninguém estava acostumado a associar a saúde à comunidade.

É necessário ir além do indivíduo. E também conhecer a cultura da qual ele faz parte, saber quem são seus amigos, sua família e a cidade de origem de seus familiares. É preciso aceitar a ideia de que os valores do mundo que habitamos e as pessoas que nos cercam exercem um grande efeito em quem nós somos.

PARTE I – Oportunidade

Capítulo 1 – O efeito “Mateus”

“Ergam a cabeça”, disse Robert Winthrop diante de uma multidão, anos atrás, na inauguração de uma estátua do herói da independência americana Benjamin Franklin, “e vejam a imagem do homem que veio do nada, que nada deveu à família e a protetores, que não usufruiu as vantagens da educação básica, agora totalmente disponíveis a todos, que realizou os serviços mais subalternos na juventude, mas que viveu até ser recebido por reis e morreu deixando um nome que o mundo jamais esquecerá.”

Neste livro, pretendo convencê-lo de que esse tipo de explicação pessoal para o sucesso não funciona. Ninguém surge do nada. Devemos alguma coisa à família e a protetores. Aqueles que são recebidos por reis podem dar a impressão de que fizeram tudo sozinhos. Na verdade, porém, eles são, invariavelmente, os beneficiários de vantagens ocultas, oportunidades extraordinárias e legados culturais que lhes permitiram aprender, trabalhar duro e entender o mundo de uma forma que os outros não conseguem. O lugar e a época em que crescemos fazem a diferença. A cultura a que pertencemos e os legados transmitidos por nossos ancestrais moldam os padrões de nossas realizações inimagináveis. Em outras palavras, não basta querer saber como são as pessoas de sucesso. Somente perguntando de onde elas são poderemos deslindar a lógica por trás de quem é ou não bem-sucedido.

O sucesso é o resultado do que os sociólogos denominam “vantagem cumulativa”. O jogador de hóquei profissional inicia a carreira um pouquinho melhor do que os colegas. E essa pequena diferença leva a uma oportunidade que a torna muito maior. Essa nova vantagem, por sua vez, proporciona outro benefício, que aumenta ainda mais a diferença inicial – e assim por diante, até que o jogador se torne um genuíno outlier. Mas, no princípio, ele não era fora de série – apenas começou um pouquinho melhor do que os demais.

Capítulo 2 – A regra das 10 mil horas

A história da genialidade de Bill Joy [cofundador da Sun Microsystems] foi contada inúmeras vezes, e as lições são sempre as mesmas. Aquele era um mundo da mais pura meritocracia. A programação de computadores não funcionava como uma rede de influências em que as pessoas progrediam graças ao dinheiro ou a amizades. Era um grande campo aberto em que todos os participantes eram julgados apenas pelo talento e pelas realizações. Somente os melhores venciam, e Joy era claramente um deles.

Seria mais fácil aceitar essa versão dos acontecimentos, se não estivéssemos analisando o mundo dos jogadores de hóquei e futebol. Acreditávamos que esses esportes fossem uma genuína meritocracia. Mas não é bem assim. Vimos como os outliers de uma área específica atingem um status elevado por meio de uma combinação de capacidade, oportunidade e vantagem totalmente arbitrária. A ideia de que a excelência em uma tarefa complexa requer um nível de prática mínima está sempre ressurgindo em estudos de expertise. Na realidade, os pesquisadores chegaram ao que acreditam ser o número mágico para a verdadeira excelência: 10 mil horas.

“Essas pesquisas indicam que são necessárias 10 mil horas de prática para se atingir o grau de destreza pertinente a um expert de nível internacional em qualquer atividade”, diz o neurologista Daniel Levitin. “Em um estudo após o outro, observamos compositores, jogadores de basquete, escritores de ficção, esquiadores, pianistas, jogadores de xadrez, mestres do crime, seja o que for, esse número sempre ressurge. Dez mil horas equivalem a cerca de três horas por dia, ou 20 horas por semana, de treinamento durante 10 anos. É claro que isso não explica por que alguns indivíduos se beneficiam de suas sessões de preparação mais do que outros. Mas ninguém encontrou ainda um caso em que a excelência de nível internacional tenha sido alcançada em um prazo menor. Parece que o cérebro precisa desse tempo para assimilar tudo o que é necessário para atingir a verdadeira destreza.”

Mesmo Mozart – o maior prodígio musical de todos os tempos – só conseguiu atingir a plena forma com 10 mil horas. A prática não é aquilo que ela faz quando se torna boa em algo, mas aquilo que ela faz para se tornar boa em algo.

Capítulo 3 – O problema com os gênios –parte 1

Logo após a Primeira Guerra Mundial, Lewis Terman, um jovem professor de psicologia da Universidade de Stanford, conheceu um adolescente chamado Henry Cowell. Esse jovem crescera em meio à pobreza e ao caos. Não recebia nenhum ensino formal desde os sete anos, pois tinha dificuldade em se relacionar com crianças de sua idade, e trabalhava como faxineiro numa pequena escola primária perto do campus. Algumas vezes, Cowell dava um jeito de escapar do trabalho para tocar piano na escola. E a música que se ouvia era linda.

A especialidade de Terman era elaborar testes de inteligência. Uma de suas criações foi o Stanford-Binet, teste padrão de QI que milhões de pessoas fariam em todo o mundo nos 50 anos seguintes. Ele decidiu testar o QI de Cowell. “Esse rapaz deve ser inteligente”, pensou, e tinha razão. Cowell revelou um QI superior a 140, o nível da genialidade. Terman ficou fascinado. E imaginou quantos diamantes brutos existiriam por aí. Ele criou um grupo seleto de QIs superiores a 140 e os observou ao longo de anos. Eram chamados de “Térmites”.

Chris Langan, um indivíduo superdotado, foi testado por vários psicólogos. Tinha um QI 30% superior ao de Einstein. Mas isso não significa que Langan seja 30% mais inteligente do que ele. Essa conclusão seria ridícula. Tudo o que podemos dizer é que, quando se trata de pensar em temas difíceis como física, ambos são suficientemente inteligentes.

A ideia de que o QI possui um limite parece, no entanto, ir contra a nossa intuição. Tendemos a acreditar, por exemplo, que os ganhadores do Prêmio Nobel devem ter os maiores QIs imagináveis, devem ter passado no vestibular com as notas mais altas, ganhado todas as bolsas de estudo disponíveis e frequentado as maiores universidades.

Mas, se verificarmos onde os últimos 25 americanos a ganhar o Prêmio Nobel em Medicina se graduaram a partir de 2007, veremos que nem todos eles frequentaram as universidades que costumam receber os melhores estudantes do ensino médio nos Estados Unidos. A lista de instituições mostra que, embora alguns deles tenham se formado no MIT, em Yale e em Columbia, há também os que se diplomaram em DePauw, Holy Cross e Gettysburg College, apenas boas universidades.

Capítulo 4 – O problema com os gênios – parte 2

A habilidade específica que permite a alguém se desvencilhar de uma acusação de assassinato ou convencer seu professor a passá-lo do período da manhã para o da tarde é aquilo que o psicólogo Robert Sternberg chama de “inteligência prática”. Para Sternberg, a inteligência prática inclui elementos como “saber o que dizer e para quem, saber quando dizê-lo e saber como dizê-lo para obter o máximo de efeito”. E uma questão prática: é saber como fazer algo, sem necessariamente saber por que se sabe aquilo nem ser capaz de explorar isso. É da natureza pragmática, ou seja, não se trata do conhecimento pelo conhecimento. É o conhecimento que ajuda a interpretar as situações de modo correto e obter o que se deseja. E, um ponto fundamental: é um tipo de inteligência diferente da capacidade analítica medida pelo QI. Uma pessoa pode ter muita inteligência analítica e pouquíssima inteligência prática, assim como pode ser rica em inteligência prática e pobre em inteligência analítica ou, como no caso afortunado de alguém como Robert Oppenheimer, pode ter as duas.

Annette Lareau, da Universidade de Maryland, enfatiza que um estilo não é melhor do que o outro [cultivo orquestrado e crescimento natural] em termos morais. Na verdade, teve a impressão de que as crianças mais pobres muitas vezes se comportavam melhor, além de serem menos choronas, mais criativas na utilização de seu próprio tempo e mais independentes. No entanto, em termos práticos, o “cultivo orquestrado” apresenta grandes vantagens. As crianças de classe média, com sua agenda sobrecarregada, estão expostas a um conjunto de experiências em constante mudança. Ela aprende a trabalhar em equipe e a enfrentar ambientes altamente estruturados. É ensinada também a interagir de forma tranquila com adultos e a se manifestar quando necessário.

Um estudo de Terman comparou um grupo de alunos classe A (classe média) com outra C (classe pobre). Aos cinco, seis anos, os dois grupos tiveram as mesmas qualidades, como curiosidade, agilidade mental e brilho. A verdade nua e crua do estudo de Terman, porém, é que, no fim das contas, quase nenhuma das crianças geniais da classe social e econômica mais baixa conseguiu se destacar.

O que faltou àquelas pessoas? Não foi nada dispendioso nem impossível de encontrar; não foi uma característica codificada no DNA nem programada nos circuitos do cérebro. O que elas não tiveram foi algo que poderiam ter recebido, se soubessem que era daquilo que necessitavam: uma comunidade ao redor que as preparasse para o mundo.

Capítulo 5 – As três lições de Joe Flom

Espero que, a essa altura, você já não acredite tão facilmente nesse tipo de história (a de Joe Flom, do escritório de advocacia Skadden, Nova York). Um brilhante filho de imigrantes supera a pobreza e a Depressão, não consegue empego nos escritórios tradicionais de advocacia e vence por conta própria, graças à sua ambição e capacidade. É a história do desvalido que enriquece, porém tudo o que vimos até agora envolvendo jogadores de hóquei, bilionários do software e os Térmites indica que o sucesso não surge dessa maneira. A sua origem importa. Eles são produtos de lugares e ambientes específicos.

“Os escritórios consagrados passaram um longo tempo considerando as aquisições hostis algo desprezível. Até decidirem que talvez devessem atuar nessa área também, deixaram-me sozinho, conta Flom. E uma vez que uma pessoa adquire a reputação de fazer esse tipo de trabalho, ela tem a preferência dos clientes”, diz.

Pense em como essa história se assemelha às de Bill Joy e Bill Gates. Ambos batalhavam num campo relativamente obscuro, sem grandes esperanças de sucesso. Até que – bum! – aconteceu a revolução dos computadores pessoais, e eles tinham as suas 10 mil horas de prática. Estavam preparados.

PARTE II – Legado

Capítulo 6 – Harlan, Kentucky

Quando uma família briga com outra, temos um conflito. No entanto, quando muitas famílias se enfrentam em cidadezinhas como essas, acima e abaixo da mesma cadeia de montanhas, temos um padrão.

Qual seria a causa dos confrontos nos Apalaches? Ao longo dos anos, diversas causas potenciais foram pesquisadas e debatidas. O consenso parece ser que essa região era assolada por uma espécie particularmente virulenta do que os sociólogos denominam de “cultura da honra”.

Na parte sudeste do Kentucky, no trecho da cordilheira dos Apalaches, conhecido como Cumberland Plateau, localiza-se a pequena cidade de Harlan. Esta se tornou conhecida pela luta fraticida entre duas famílias, os clãs Howard e Turner, com muitas vítimas de ambos os clãs, em sucessivas gerações. Uma história indigesta.

Então, por que os Apalaches eram desse jeito? Por causa da procedência de seus habitantes originais. Os chamados estados do interior dos Estados Unidos – desde a fronteira da Pensilvânia, ao sul, e a oeste pela Virgínia, Virgínia Ocidental, Kentucky, Tennessee, Carolina do Norte, Carolina do Sul e a extremidade norte do Alabama e da Geórgia – foram ocupados por imigrantes de uma das culturas da honra mais violentas do mundo. Eles eram “escoceses-irlandeses”, ou seja, das terras baixas da Escócia, dos condados ao norte da Inglaterra e de Ulster, na Irlanda do Norte.

Quando emigraram para os Estados Unidos, foram para o interior do país, instalando-se em lugares longínquos, sem lei, rochosos e inférteis, como Harlan, que permitiram reproduzir no Novo Mundo, a cultura de honra que haviam criado no Velho Mundo.

A verdade pura e simples é que, se quisermos entender o que aconteceu naquelas cidadezinhas do Kentucky no século XIX, temos que voltar ao passado e não apenas a uma ou duas gerações atrás. Precisamos retroceder 200 a 400 anos, ir a um país do outro lado do oceano e examinar cuidadosamente o meio de subsistência das pessoas numa área geográfica bem específica. A hipótese da “cultura da honra” afirma que a nossa procedência importa, não apenas em termos de onde nós e nossos pais fomos criados, mas em termos de onde os nossos bisavós, trisavós até nossos tetravós cresceram. Esse é um fato estranho e poderoso. Porém, é só o começo, pois, se analisados com atenção, os legados culturais revelam-se ainda mais incomuns e impressionantes.

Capítulo 7 – A teoria étnica dos acidentes de avião

Vinte anos antes do acidente com o KAL 801 (em Guam), um Boeing da Korean Air penetrou inadvertidamente no espaço aéreo russo e acabou sendo derrubado por um jato militar soviético sobre o mar de Barents. Foi um acidente, ou seja, o tipo de episódio raro e catastrófico que, a não ser por intervenção divina, poderia acontecer com qualquer companhia aérea. Com a investigação e a análise do fato, aprenderam-se lições. Relatórios foram elaborados.

Dois anos depois, um Boeing 747 da Korean Air caiu em Seul. Dois acidentes em dois anos não é um bom sinal. Três anos mais tarde, a companhia perdeu outro 747 perto da ilha Sakhalin, na Rússia. A esse desastre seguiram-se a queda de um Boeing 707 no mar de Andaman em 1987, dois acidentes em 1989 (em Tripoli e em Seul), além de outro em Cheju, Coréia do Sul, em 1994.

A mitigação explica uma das grandes anomalias dos desastres aéreos. Nos aviões comerciais, pilotos e copilotos dividem de modo igual as tarefas da pilotagem. Mas, historicamente, os acidentes tendem mais a ocorrer quando o piloto está no comando. Isso parece não fazer sentido, uma vez que ele quase sempre é mais experiente. Pense, porém, na queda do avião da Air Florida. Se o copiloto fosse o piloto, teria dado um palpite três vezes? Não, teria dado uma ordem e o desastre não aconteceria. Os aviões são mais seguros quando o piloto menos experiente está à frente, porque ele não tem medo de se manifestar.

Combater a mitigação se tornou uma das principais cruzadas da aviação comercial nos últimos anos. Hoje em dia, todas as grandes companhias aéreas aplicam o treinamento “Gestão de Recursos da Tripulação” para instruir os membros mais novos da tripulação a se comunicar com clareza e segurança.

Em 2000, a companhia Korean Air enfim agiu, contratando um profissional de fora – David Greenberg, da Delta Airlines – para dirigir as operações de voo. A regra de Greenberg era simples: a nova língua da Korean Air era o inglês, e quem quisesse continuar piloto da companhia teria que ser fluente nesse idioma.

Na lógica de Greenberg, o inglês era a língua do mundo da aviação. Os pilotos teriam que dominar esse idioma porque, quando se sentavam na cabine e examinavam os checklists que toda tripulação de voo segue em cada ponto significativo dos procedimentos, o conteúdo daquelas listas era em inglês. Quando se comunicam com o CTA em qualquer ponto do mundo, as conversas eram em inglês.

A tradição coreana era de muito respeito à autoridade, um carisma oriental. Greenberg acreditava que, se os coreanos fossem honestos sobre suas origens e estivessem dispostos a confrontar os aspectos de sua tradição que eram inadequados ao mundo da aviação, os coreanos poderiam melhorar. Ofereceu aos pilotos o que todos – jogadores de hóquei, magnatas do software – haviam recebido no caminho ao sucesso: uma oportunidade de transformar seu relacionamento com o trabalho. Os coreanos aproveitaram a oportunidade e deram a volta por cima, recebendo prêmios internacionais. Em 2006, a empresa Korean Air recebeu o Prêmio Phoenix da Air Transport World por sua transformação.

Capítulo 8 – Arrozais e testes de matemática

O arroz vem sendo cultivado na China há milhares de anos. Foi a partir desse país que as técnicas de cultivo do arroz se difundiram pelo sul da Ásia, Japão, Coreia, Cingapura, Taiwan. A cada ano, desde os primeiros registros históricos, os camponeses de todo o continente têm adotado incansavelmente o mesmo padrão intrincado de agricultura.

O campo para o arroz tem que ter um solo de argila duro para impedir que a água penetre. Mas é evidente que as plântulas de arroz não podem ser fincadas na argila dura. Portanto, é preciso cobri-la com uma camada espessa e mole de lama. E essa camada deve ser totalmente nivelada para permitir que a drenagem da água ocorra da forma apropriada, deixando as plantas submersas no nível ideal. É necessário ainda fertilizar o campo diversas vezes, o que constitui uma arte.

Arroz era o que os camponeses vendiam no mercado para que pudessem comprar os outros produtos de que necessitavam. A riqueza e o status eram medidos por ele.

Observe a seguinte lista de números: 4, 8, 5, 3, 9, 7, 6. Leia-a em voz alta. Agora não olhe para a lista e passe 20 segundos memorizando a sequência antes de dizê-la em voz alta de novo.

Se você fala uma língua ocidental, tem cerca de 50% de chance de se lembrar da sequência perfeitamente. No entanto, caso seja chinês, é quase garantido que a acertará todas as vezes que a ler. Por quê? Porque, como seres humanos, armazenamos dígitos num ciclo de memória que dura cerca de dois segundos. Memorizamos com facilidade o que conseguimos dizer ou ler nesse intervalo. E quem fala chinês acerta a lista de números – 4, 8, 5, 3, 9, 7, 6 – porque sua língua permite enquadrar todos os sete algarismos em dois segundos.

“O sistema asiático é transparente”, diz Karen Fuson, psicólogo da Northwestern University, que realizou um grande número de pesquisas sobre as diferenças entre os asiáticos e os ocidentais. “Ele modifica a atitude em relação à matemática. Em vez de um aprendizado mecânico, existe um padrão que a pessoa consegue identificar. Há uma expectativa de que ela é capaz de fazer aquilo e de que existe uma lógica no processo. No caso de frações, dizemos três quintos. Em chinês é, literalmente, ‘de cinco partes, pegue três’. Isso é definir uma fração de modo conceitual. É distinguir o denominador do numerador.

As crianças asiáticas, ao contrário, não têm a mesma sensação de confusão. Elas conseguem memorizar mais números e fazer cálculos com mais rapidez.

Os legados culturais realmente importam. Depois de vermos os efeitos surpreendentes de questões como a distância do poder e os números que podem ser pronunciados em menos de um quarto de segundo, não podemos deixar de nos perguntar quantas outras heranças culturais interferem nas tarefas intelectuais da atualidade. E se o fato de uma pessoa vir de uma cultura moldada pelas exigências do cultivo de arroz também a tornar melhor em matemática? O arrozal poderia fazer essa diferença na sala de aula?

Capítulo 9 – A barganha de Marita

A KIPP Academy, no bairro Bronx, Nova York, parece ser o tipo de escola, no tipo de bairro e com o tipo de alunos que leva qualquer educador ao desespero. O programa KIPP foi fundado pelos professores David Levin e Michael Feinberg, condoídos com a fragilidade cultural das crianças pobres do bairro. No entanto, no minuto em que transpomos suas portas, fica claro que há algo diferente. Ali as crianças andam silenciosamente pelos corredores, em fila indiana. Nas salas de aula, são ensinadas a se comunicar com as pessoas adotando um procedimento conhecido como SSLANT: sorria (smile), sente-se reto (sit up), ouça (listen), faça perguntas (ask questions), acene com a cabeça quando falarem com você (nod…) e acompanhe com seus olhos (track with your eyes). Nas paredes dos corredores, estão penduradas centenas de flâmulas das faculdades onde os ex-alunos da KIPP foram estudar.

A área em que a KIPP é mais famosa é a matemática. Em South Bronx, somente 16% dos estudantes da quinta à oitava série alcançam um desempenho bom ou ótimo nessa disciplina.  Na KIPP, porém, essa é a matéria favorita de muitos alunos que estão terminando a quinta série. Nessa escola as crianças começam a estudar álgebra de nível médio já na sétima série. No fim da oitava série, 84% dos estudantes da KIPP apresentam um desempenho bom ou ótimo em matemática.

Um dos problemas da educação nos EUA reside nas férias muito longas: três meses no verão. Isso se refletiu no rendimento escolar americano frente a outros países.

As causas da superioridade dos asiáticos em matemática se mostram ainda mais óbvias. As férias dos alunos das escolas asiáticas não são longas. Por que haveriam de ser? Culturas que acreditam que o caminho para o sucesso está em acordar antes do amanhecer, 360 dias por ano, dificilmente concederão à suas crianças três meses de férias no verão. Nos Estados Unidos, o ano escolar dura, em média, 180 dias; na Coréia do Sul, 220 dias; no Japão, 243 dias.

Em um teste de matemática aplicado a estudantes do mundo inteiro, foi perguntado aos participantes quantas das questões de álgebra, cálculo e geometria daquele exame envolviam matérias que eles já haviam estudado no colégio. Para alunos japoneses da 12ª série (correspondente ao último ano do ensino médio), a resposta foi de 92%. Esse é o valor de ir à escola 243 dias por ano. A pessoa tem tempo de aprender tudo o que é necessário e menos tempo para se esquecer daquele conhecimento. Para os americanos da 12ª série, a resposta foi de 54%.

Essa não foi a questão do KIPP, que tem férias restritas, e três semanas de horas extras de aulas no mês de julho.

Marita, uma das alunas do KIPP, assim como outros alunos, acorda antes das 6h da manhã. E por isso, às vezes, cochila na aula. Marita não necessita de uma escola novinha em folha, instalações reluzentes e uma imensidão de quadras de esportes. Ela não precisa de um laptop, de uma turma menor, de um professor com Ph.D. nem de um apartamento maior. Também não precisa de um QI mais elevado, com mente superágil. Todas estas coisas seriam ótimas, é claro. Mas nada disso atinge o ponto central da questão. Marita necessita apenas de uma chance, porque as pessoas em seu mundo raramente obtêm até uma única oportunidade de sucesso na vida.

Ficha técnica:

Título: Outliers

Autor: Malcolm Gladwell

Resumo: Rogério H. Jönck

Edição: Monica Miglio Pedrosa

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